Os munícipes pagarão pela
arbitrariedade praticada pelo chefe do Executivo.
O Ministério Público deve agir
contra o prefeito por conta do crime cometido – o que ele fez é crime - e,
transitada em julgado a sentença, deveria o Município promover ação de
ressarcimento contra o prefeito – será que ajuizará?
A notícia foi veiculada pela
imprensa do TJSP e a decisão, tendo em vista prática de ato ilegal por desvio
de finalidade, que gera danos financeiros ao erário, determinou extração de
cópias e o envio da sentença para que o Ministério Público tome as providências
que entender pertinentes diante da possível prática de ato de improbidade por
parte do sr. Prefeito e da testemunha Leda Maria Sarti.
A
1ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo condenou a
Prefeitura Municipal de São Roque a indenizar funcionária em R$ 20 mil, a
título de danos morais, e determinou também a anulação de sua transferência e o
consequente retorno ao seu posto de trabalho.
Consta
dos autos que a servidora teria, durante campanha de vacinação ocorrida no ano
de 2010, se negado a passar o filho do prefeito na frente de outras pessoas que
estavam na fila para serem vacinadas.
Por
esse motivo, foi transferida do posto de trabalho e teve instaurado contra si
processo administrativo para apurar eventual falta funcional.
Ao
julgar a apelação, o desembargador Danilo Panizza, relator do recurso, afirmou
que “o contexto fático e as provas dos autos demonstram que a autora sofreu
constrangimento, abalando-a psicologicamente, com a ilegal transferência de
local de trabalho e por ter que responder a processo disciplinar, sendo devida
a indenização por danos morais no pressuposto de abuso de direito por parte do
superior hierárquico”.
O
julgamento contou com a participação dos desembargadores Luís Francisco Aguilar
Cortez e
Vicente de Abreu Amadei, que acompanharam o voto do relator.
Apelação
nº 0006358-23.2010.8.26.0586
Fonte:
TJSP, 20/11/2013 – VG (texto) / AC (foto ilustrativa)
Apelação com revisão nº 0006358-23.2010.8.26.0586
Voto nº 21.389
INDENIZATÓRIA DANO MORAL AUXILIAR
DE ENFERMAGEM QUE SE RECUSA A DAR TRATAMENTO ESPECIAL A FILHO DE AUTORIDADE
DESOBEDIÊNCIA À SUPERIOR HIERARQUICO - PERSEGUIÇÃO E TRANSFERÊNCIA ARBITRÁRIA
DE LOCAL DE TRABALHO PROCEDÊNCIA EM PARTE IRRESIGNAÇÃO - FATOS DEMONSTRADOS
COMPROVADO O NEXO CAUSAL - MANTENÇA. RECURSO NEGADO.
Vistos.
TCBO propôs ação pelo rito
ordinário com pedido de tutela antecipada, de indenização de danos morais
contra a Prefeitura Municipal da Estância Turística de São Roque, perante o
Juízo da 2ª Vara Judicial da Comarca de São Roque, objetivando indenização por
dano moral, sustentando ser funcionária pública municipal há 13 (treze) anos, e
que sua transferência de local de trabalho ocorreu pelo fato de não ter passado
o sr. Luis (filho do Prefeito Municipal de São Roque) na frente das outras
pessoas que
aguardavam para tomar vacina na
campanha contra a gripe H1N1, assim respondeu a processo disciplinar e foi
transferida de local de trabalho, sentindo uma grande sensação de impotência e
de vulnerabilidade. Pede a condenação da requerida na obrigação de fazer, determinando
a permanência definitiva da requerente no setor da Vigilância Epidemiológica do
Centro de Saúde II, inclusive liminarmente, bem como no pagamento de uma
indenização por danos morais, no valor correspondente a 100 salários mínimos.
Pede a procedência da ação.
A r. sentença de fls.235/237vº,
julgou parcialmente procedente o pedido para anular o ato administrativo
estampado pelo memorando nº 50/2010-VE, determinando o imediato retorno da
autora ao seu posto de trabalho, bem como condeno a ré ao pagamento de indenização
por danos morais sofridos pela autora no valor de R$ 20.000,00, com correção monetária e juros
embutidos, tudo pelo índice da poupança, desde a presente data, em homenagem ao
disposto no art. 1º-F da Lei 9494/97. Assim, resolvo o mérito da questão nos
termos do inciso I do art. 269 do Código de Processo Civil. Em razão da sucumbência
mínima da autora , condeno a ré ao pagamento das custas e despesas processuais
de que não for isenta, bem como dos honorários advocatícios da parte contrária
, os quais , com fundamento nos §§ 3º e 4º do art. 20 do Código de Processo
Civil, arbitro em 18% do valor da condenação devidamente atualizada, observando-se
a incidência do art. 1-F da Lei 9494/97. Considerando que o Juízo chegou à
conclusão de que houve a prática de ato ilegal por conta do desvio de
finalidade, o qual gera danos financeiros ao erário, determinação extração de
cópia de fls. 1/17, 19, 21/69, 117/144 e da presente sentença para o Ministério
Público para que tome as providências que entender pertinentes diante da
possível prática de ato de improbidade por parte do sr. Prefeito e da testemunha
Leda Maria Sarti.
A Prefeitura da Estância Turística
de São Roque apelou a fls.248, recebido a fls.266, discorrendo que o Estatuto
não apenas não garante ao servidor o desempenho de suas atividades em
determinado posto ou local como, ainda, autoriza que a Administração mude o servidor
de local, dentro da mesma repartição, de acordo com as necessidades de cada
posto de trabalho, pedindo reforma da r. sentença e o provimento do recurso.
Contrarrazões a fls. 268.
É o relatório.
Narra a autora que em 05.04.2010,
nas dependências da Vigilância Epidemiológica, durante a campanha de vacinação
contra a gripe H1N1, compareceu no setor para tomar a vacina, o sr. Luís Gustavo
Godinho, filho do Prefeito Municipal de São Roque, sendo, porém, que como não
portava o cartão, a requerente pediu ao mesmo que aguardasse na fila, e que
continuou atendendo os munícipes normalmente, quando se deparou novamente com o
sr,. Luís Gustavo acompanhado da srª Leda, Chefe de Serviço de Saúde, a qual, pretendendo
passar o mesmo na frente das outras pessoas, gritou com a requerente que “Teresa
o dele é vacina!” Ocasião em que respondeu que já havia pedido para que ele
aguardasse na fila, quando, então a srª Leda lhe disse que o sr. Luís Gustavo
era filho do Prefeito.
Assim, em virtude da situação
criada, e discussão das funcionárias, o sr. Luís Gustavo acabou indo embora sem
tomar a vacina, e que passadas algumas horas a srª Leda retornou à sala da requerente
apontando o dedo e gritando para a mesma que o moço que ela não quis vacinar
era filho do Prefeito, que tanto a srª Eunice, esposa do Prefeito, quanto o
próprio Prefeito estariam muito bravos com ela e que em virtude do ocorrido, a
requerente seria transferida da Vigilância Epidemiológica.
O que ensejou a abertura de uma
sindicância para apurar os fatos, na qual foram ouvidos todos os funcionários
que estavam trabalhando no dia, a Chefe imediata da requerente, o Diretor de
Saúde e o sr. Luís Gustavo, sendo que o mesmo foi arquivado, o qual a Comissão
Permanente opinou pelo arquivamento da Sindicância, entendendo que o ocorrido
não teria passado de uma discussão desnecessária e sem maiores repercussões.
Ocorre, que o acontecimento acabou
transformando-se em um trauma psicológico para a autora, com a ilegal
transferência de local de trabalho e por ter que responder a processo
disciplinar, sentindo uma grande sensação de impotência e de vulnerabilidade, o
que a levou a fazer tratamento psiquiátrico.
Portanto, verificou-se dos
depoimentos prestados que a autora, no dia 05.04.2010, durante a campanha de
vacinação contra a gripe H1N1, pediu ao filho do Prefeito que aguardasse sua
vez para ser atendido, sendo que logo em seguida a srª Leda determinou que ela vacinasse
o rapaz, oportunidade que respondeu que já havia pedido para ele aguardar na
fila, se recusando a passar o filho do Prefeito na frente dos demais munícipes,
e este se retirou sem tomar a vacina.
Após a discussão entre a autora e
a srª Leda, esta prometeu retirar a autora daquele posto de saúde, sendo
instaurado processo administrativo disciplinar contra a autora, o qual foi arquivado,
após a Comissão Permanente opinar pelo arquivamento da Sindicância, entendendo
que o ocorrido não teria passado de uma discussão desnecessária e sem maiores
repercussões.
Portanto, o que se observa do
apurado nos autos, é que a autora sofreu punição por não ter dado tratamento
diferenciado ao filho do Prefeito, tratando-o com igualdade em relação aos
munícipes, sofrendo assim, o processo administrativo e sua transferência para
outro posto.
Sob esta ótica, ocorreu
caracterização de elementos que embasem a reparação, havendo nexo de
causalidade entre o evento ocorrido e a sua transferência.
Para obtenção de reparação de
danos, “basta que o lesado demonstre o nexo causal entre o fato lesivo e o
dano, bem como o seu montante” (RT 647/134).
Salienta-se os contornos da
responsabilidade do ente público, restando configurada tal situação, em casos
como o sob exame, gerando o seu dever de indenizar, são traçados pelos artigos
186 e 927, ambos do Código Civil, dispondo que:
"Aquele que
por omissão, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar
direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato
ilícito."
“Aquele que, por
ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.”
Contudo, para que exista a obrigação
de indenizar, é preciso que se comprove o dano, a conduta do agente causador e
bem assim, o nexo causal entre ambos.
Assim, não se desconhece que para
efeito de aferição de abalo moral, de modo a autorizar a correspondente
indenização, basta que seja demonstrado o fato passível de acarretar
constrangimento ou sofrimento à vítima.
Nestes termos, o contexto fático e
as provas dos autos demonstram que à autora sofreu constrangimento, abalando-a psicologicamente
, com a ilegal transferência de local de trabalho e por ter que responder a
processo disciplinar, sendo devida a indenização por danos morais no
pressuposto de abuso de direito por parte do superior hierárquico.
Destarte, há de responder a
Administração pela conduta ilícita de seus agentes, ensejadora do dano sofrido
pela autora.
No que tange ao quantum
indenizável, denota-se que postulada indenização não pode ser irrisória, sob
pena de não servir ao cumprimento de seu objetivo específico. Nem pode ser
excessivamente elevada, de modo a propiciar enriquecimento. Deve ser
equilibrada, porque tem finalidade compensatória.
Nestes termos, atento ao princípio
da prudência e às peculiaridades do caso sub judice, já apontadas,
ausente o critério objetivo de fixação da verba indenizatória por danos morais,
levando-se em conta a gravidade do caso, tem-se por adequada a quantia fixada pelo
douto Juiz sentenciante, alcançando a finalidade do instituto do dano moral, o
qual deve pautar comedimento, mas com finalidade de advertência ao ente que deu
causa a falha administrativa.
No respeitante a deliberação
consignada no final dar sentença, oficiando ao Ministério Público, trata-se de
matéria alheia ao contexto reparatório, apreciado, não sendo o caso de
exclusão, inclusive por tratar-se de posição pessoal do nobre magistrado e
sujeita a análise do ente legítimo para análise das condições ou não da
propositura de ação daquela ordem.
Pelo exposto, diante da
fundamentação acima colacionada, conclui-se lídima a r. decisão proferida pelo
nobre Magistrado de primeiro grau que deve prevalecer por seus próprios e
jurídicos fundamentos, admitidos os prequestionamentos dos dispositivos legais
e constitucionais passíveis de argumentação.
Com isto, nega-se provimento ao
recurso.
DANILO PANIZZA
Relator
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Esteja à vontade
para perguntar, comentar ou criticar.
Maria da
Glória Perez Delgado Sanches
Membro Correspondente da ACLAC –
Academia Cabista de Letras, Artes e Ciências de Arraial do Cabo, RJ.
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